Fim da pandemia e as implicações jurídicas da Covid-19 no ambiente do trabalho

No último dia 05 a Organização Mundial da Saúde (OMS), anunciou que a Covid -19 não é mais uma emergência de Saúde Pública, portanto, após mais de 3 anos a Covid-19, a decisão desta sexta-feira colocou fim na emergência em saúde e foi motivada pela queda no número de casos e de mortes pela doença, aliada ao avanço da vacinação da população. Pelas estimativas da OMS, desde 2020, a doença matou mais de 7 milhões de pessoas em todo o mundo.
Em retrospectiva no Brasil, o Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020 inaugurou o início de elaboração normativas federais, estaduais e municipais, em especial de Medidas Provisórias (MPs) que criaram por assim dizer um direito emergencial em atenção à prevenção da COVID-19.
Entretanto ainda alertamos sobre repercussões bastante importantes no Direito do Trabalho, especialmente no que se refere às implicações da COVID-19.
Entre os regramentos jurídicos elaborado para o contexto da crise pandêmica do coronavírus, destaca-se, a MP nº 927/2020, a qual tratou especificamente acerca do não enquadramento da Covid-19 como doença ocupacional, afastando a presunção de contágio do trabalhador.
Art. 29. Os casos de contaminação pelo coronavírus (covid-19) não serão considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo causal.
Ocorre que à época foram impetradas ADI (ações diretas de inconstitucionalidades), e em caráter liminar, o STF decidiu pela suspensão da eficácia do questionado art. 29 da MP nº 927/2020, pela maioria de 7 (sete) votos a 3 (três).
Desta forma o citado art. 29 da MP nº 927/2020 teve sua eficácia suspensa por inconstitucionalidade declarada pela Suprema Corte Federal, e posteriormente a referida MP não fora convertida em Lei, tendo sua vigência expirada em 19/07/2020.
Conclusivamente, tanto a liminar concedida pelo STF, como a perda da vigência da norma, fez prevalecer sobre o tema, as regras previstas na Lei nº 8.213/91.
Não há, portanto, nenhuma inovação no ordenamento jurídico relacionado à doença ocupacional, assim, o enquadramento da doença relacionada ou não ao trabalho será verificado considerando o caso concreto, levando-se em consideração as previsões contidas na Lei nº 8.213/91, especialmente no artigo 20, devendo ser comprovada a relação de causa e efeito entre a patologia e a atividade laboral.
Art. 20. Consideram-se acidente do trabalho, nos termos do artigo anterior, as seguintes entidades mórbidas:
I – doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social;
II – doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso I.
§ 1º Não são consideradas como doença do trabalho:
c) a que não produza incapacidade laborativa;
d) a doença endêmica adquirida por segurado habitante de região em que ela se desenvolva, salvo comprovação de que é resultante de exposição ou contato direto determinado pela natureza do trabalho.
§ 2º Em caso excepcional, constatando-se que a doença não incluída na relação prevista nos incisos I e II deste artigo resultou das condições especiais em que o trabalho é executado e com ele se relaciona diretamente, a Previdência Social deve considerá-la acidente do trabalho.
A alínea d do dispositivo em comento exclui o enquadramento como doença ocupacional, a doença endêmica, entendida como aquela que, por força das condições locais, se manifesta habitualmente na população de determinada região considerando que qualquer um de seus habitantes está suscetível ao adoecimento, poderia se concluir que a doença endêmica não teria natureza ocupacional e, por analogia, aplicar o mesmo entendimento à pandemia da Covid-19, cuja base teoria é semelhante.
Entretanto, o mesmo dispositivo que exclui o caráter ocupacional da doença, em sua parte final, ressalva os casos em que há comprovação de que a doença resulta da exposição ou do contato direto ocorrido em função do trabalho.
Daí porque, como preleciona o ministro do TST Cláudio Brandão:
“a doença, mesmo endêmica – ou pandêmica, no caso da Covid-19 – pode ser considerada de natureza ocupacional quando resulte das condições de trabalho, como no caso de o empregado transferido de região onde não ainda não existia venha a contrair a doença por trabalhar em local em que esteja disseminada ou quando, mesmo habitando-a, não seja portador da doença e a adquira pelo fato de haver sido exposto ao contágio, como no caso específico dos profissionais de saúde ou dos trabalhadores que executam as atividades de limpeza e higienização dos estabelecimentos de saúde; motoristas de ambulância e carros funerários; trabalhadores em cemitérios, entre outros.”
Especialmente quando o exercício do trabalho expõe o empregado a um fator de risco de contágio acima do nível da exposição média da população daquela região.
Ao tempo que delega ao empregador a responsabilidade pela adoção e uso de medidas de proteção e segurança da saúde do trabalhador (§ 1º, art. 19), com efeito, a regra geral será a responsabilização do empregador de forma subjetiva, cabendo às empresas adotarem medidas higiênicas e sanitárias adequadas para prevenção da contaminação de seus empregados, bem como fiscalizar o cumprimento dessas medidas, evitando a responsabilização por eventuais agravos decorrentes da Covid-19
Isso posto, cumpre alertar, que para haver o enquadramento da Covid-19 como doença ocupacional ou acidente de trabalho por equiparação, será necessária a comprovação do nexo causal da contaminação com a atividade desenvolvida, nesse sentido, o enquadramento da doença relacionada ou não ao trabalho deverá ser verificada considerando o caso concreto, levando-se em consideração os preceitos constitucionais e as previsões contidas na Lei nº 8.213/91.
A Covid-19 poderá ser enquadrada como doença de natureza ocupacional, mediante a comprovação do nexo de causalidade existente entre a patologia e o labor.